Nossa rotina turbulenta e apressada faz com que nunca estejamos integralmente no lugar onde deveríamos estar. Sempre consumindo forças com o porvir e esgotando a preciosa energia que precisamos para a vivência plena do momento presente. Isso impacta sobremaneira em nossa saúde, em nossas relações pessoais e em nossa capacidade laboral. E para os profissionais da saúde pode impactar diretamente no bem cuidar de seus pacientes.
Mindfulness (ou atenção plena ou consciência plena) entra nessa história como um treinamento, uma espécie de “musculação” da capacidade de vivenciar o momento presente e desenvolver foco com economia de energia e de saúde.
O tema tem chamado a atenção da comunidade científica desde que Jon Kabbat-Zin trouxe a questão para dentro do universo acadêmico em 1979. O consagrado pesquisador, com vários artigos e livros publicados, conceitua mindfulness de modo bastante específico como “a consciência que surge através do prestar atenção, intencionalmente, no momento presente, sem julgamentos”. Progressivamente, e com as demandas estressoras de nossa “sociedade líquida atual”, despontaram estudos científicos sobre possíveis alterações estruturais e aplicações de mindfulness como técnica.
Esse instigante assunto foi o tema da palestra “Mindfulness – Quais as evidências de que a atenção plena pode ajudar nossos pacientes e seus terapeutas?”, proferida em 28 de maio na reunião mensal do Centro de Estudos Psiquiátricos Américo Bairral (Cepab) pela médica psiquiatra Dra. Viviane Franco, que é Mestre em Ciências da Saúde pela Unicamp, doutoranda em Psicologia Social e preceptora da Residência Médica em Psiquiatria do Instituto Bairral. Seu pronunciamento trouxe alguns estudos e revisões recentes evidenciando alterações como o espessamento de área cinzenta em determinadas regiões cerebrais e possíveis alterações nas redes sinápticas envolvendo a ínsula e regiões corticais. E também evidências de que praticantes de longa data apresentam mudanças na expressão gênica e na produção de fatores relacionados à inflamação/efeitos anti-inflamatórios. Há, inclusive, promissores estudos relacionados à aplicação da técnica a transtornos psiquiátricos específicos. Os primeiros estudos apontaram para evidências na redução do estresse e dor crônica. Seguem-se, atualmente, investigações sobre melhora da qualidade de vida, redução de recidiva de episódios depressivos, insônia e também no tabagismo e outras dependências, transtornos alimentares e transtorno de estresse pós-traumático. Os estudos relacionados aos transtornos de ansiedade seguem com certa divergência. Quanto a transtornos como TOC, TDAH e esquizofrenia, os estudos trazem resultados pouco consistentes. Alguns desses estudos salientam a necessidade da observação de certa estabilidade clínica para a aplicação das técnicas. Também reforçam a necessidade de maior rigor metodológico, controle de variáveis confundidoras e número maior de pacientes analisados em estudos longitudinais.
A palestra enfatizou não só a prática formal de mindfulness como os momentos destinados ao exercício de meditação, como também as ditas atitudes mindfulness como agentes significativos para a busca de uma melhor qualidade de vida. Assim, além de uma prática regular, com exercícios de meditação, pontuados pelo cuidado para não cair na armadilha do excessivo julgamento, o cultivo continuado de atitudes como a mente de principiante, aceitação, desapego, confiança, paciência, gratidão e generosidade podem ser passos importantes para o autoconhecimento e para o crescimento pessoal, que ganha espaço se pudermos usar toda a energia que sobra quando aprendemos a utilizá-la com foco e de forma salutar. Não custa tentar…
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